Pular para o conteúdo principal

desculpa

“Amar é jamais ter que pedir perdão”. Já repeti essa frase dezenas de vezes, ouvi algumas boas centenas. Conheci ainda pequena as palavras eternizadas no filme Love Story, foram proferidas pela atriz Ali MacGraw. Obviamente, na época, não fez muito sentido, mas, carregada de lirismo, me encantou. Eu achava mais que bonita, era parte de um universo que eu não dominava: amar e pedir perdão. Nas minhas infantis concepções de amor, perfeita. Nas minhas vagas concepções de perdão, adequada. Adaptava na justificativa de algumas travessuras.



Descobri que John Lennon contrapôs a frase dizendo que “amar é pedir desculpas de quinze em quinze minutos”. Não sei o que meu beatle favorito, Ringo, diria sobre isso. Eu digo que me parece mais apropriado pedir desculpas ao que se gosta e muito mais a quem se gosta. Talvez digno seja pedir desculpas por gostar.



Hoje vou além de John, discordo de cada letra do filme Love Story. Pedir perdão é o que se faz antes de tudo. Pedir perdão é o que se faz durante tudo. Justificamos deslizes com gestos para camuflar o pedido de desculpas. “Oi, tele-entrega de sorvete?” Talvez o certo seja pedir desculpas antes mesmo de dar bom dia, antes dos apertos de mãos e de qualquer primeiro apressado beijo. Reconhecer que se vai errar, que é possível deixar, em algum momento, concepções e teorias prévias tomarem o lugar do que, em realidade, se vê. Nem sempre ouço a minha percepção, na verdade, confio tanto nela que morro de medo de ser traída. O que me faz ser infiel a ela. Algumas realidades são invisíveis aos olhos apenas porque não é do nosso costume ver. A surpresa com o que é bom e inusitado embaralha a visão.



Considero uma grande virtude pedir desculpas, não por achar que engrandece caráter, mas porque não estamos acostumados a reconhecer os próprios erros a tempo de não serem definitivos. Faz mais bem a quem pede. Ando em um momento em que não me permito mais errar de propósito, mas ainda me permito errar. E, por ironia, esse excesso de cuidado aliado à falta de prática do zelo, me leva ao equívoco. Parar, respirar e olhar para fora, depois para dentro é um dos melhores conselhos que um amigo já me deu. Verbalmente fácil, ativamente amplo.



Francisco Bosco disse que os conceitos são superpalavras, palavras elevadas a uma alta potência, conquistada por extrema condensação de significados. Pra mim, o perdão é um desses conceitos. Concederia milhares de explicações aos pedidos de desculpa, nenhuma delas traduziria com perfeição o significado do ato. Aliás, as possibilidades do ato são várias. Não existe amor sem perdão, sem desculpas prévias, pedidas com ou sem palavras. Já pedi desculpas com sorrisos. Já pedi desculpas com singelos convites. Já pedi desculpas com carinho. Todas as vezes, desculpas com ressentimentos. Não o ressentimento de Nietzsche, nada de negação de valores. Mas ressentimento por ter sido traída pelos zelos que insisto em ter, ainda que os meus anjos e demônios sejam unânimes em dizer “se joga”, perdi o instinto suicida em algum dos muros da vida. O ressentimento é por não ver aquilo que eu acredito quando me foi dado em mãos pelo acaso.



- Não olha pra baixo, só pula.

- E se eu cair.

- Tu cais hoje, amanhã, tu voa.

- Cansei de cair...

- Então por que não tenta voar direto? Não pensa na queda, só vai...

Acredito que eu devo aprender a me desculpar mais e melhor. Pelas vezes que eu perco a mão no tempero, pelas obviedades que eu deixo me assombrarem, por dúvidas imotivadas. Neste momento eu sou Sócrates e a minha mão treme para tomar cicuta.



O pedido de perdão é por não ter agido filosoficamente de acordo.



Apenas por curiosidade, já li que a cicuta foi apenas uma desculpa para a morte de Sócrates. O verdadeiro algoz foi a ignorância. Espero jamais ter que pedir desculpas por não saber, mas sempre poder reconhecer que não sei.







=====



DA SÉRIE DIALOGUINHOS:



- Nesse momento, não sei o que te dizer.

- Não diz nada, pra piorar vou passar um mês sem chocolate.

- Dieta?

- Não, promessa.

- Melhor assim, vai te obrigar a encarar as coisas com o coração e não com a boca.

- Heeey, injusto! Não diga isso...

- Tu tens a boca grande, é indício de pessoa gulosa, já conversamos sobre isso!

- Sim! Minha gulodice é pela vida.

- Então, relaxa, saboreia. A vida parece melhor que chocolate.

- Tem sido tão doce quanto... Olha só, se eu tivesse um objeto na mão agora, ele seria uma meia sem elástico?

- hahahaha não sei, não é pra mim que tu deve perguntar isso. Olha pra dentro.

- Vou pensar depois, então...

- Sabe o que eu vejo na tua mão agora?

- O quê?

- Retrato pra Iaiá.



(e depois disso, Los Hermanos ficaram roucos)

Given To Fly



He could have tuned in, tuned in, but he tuned outa bad time, nothing could save himAlone in a corridor, waiting, locked outhe got up out of there, ran for hundreds of milesHe made it to the oceanhad a smoke in a treeThe wind rose up, set him down on his kneeWave came crashing like a fist to the jaw,Delivered him wings, "Hey, look at me now..."Arms wide open with the sea as his floorOh, Power, oh...


He's flying! Woah!Whole! Woah! Oh...


Floated back down 'cause he wanted to sharehis key to the locks on the chains he saw everywhereBut first he was stripped, and then he was stabbedby faceless men, well... He still stands.And he still gives his love, he just gives it awaythe love he recieves is the love that is savedAnd sometimes is seen a strange spot in the skya human being that was given to fly


Flying! Woah...Whole! Flying! Woah...Flying Woah...Oh Woah...
 
 
 
(mas confesso que estava ouvindo soldier of love só por causa do tchá tchá tchá do final)

Comentários

Anônimo disse…
Eu tenho medo de falar uma coisa agora e depois dar errado por ter falado. Daqui 1 mes vc me cobra, eu tenho certeza.Beijos
Gui
Isabela disse…
Queria ser uma mosquinha para saber o que andas aprontando para ter que se desculpar até no blog. Amo tu, texto lindo, foto linda. Adorei conhecer o Tobias.
Carlos disse…
...não estamos acostumados a reconhecer os próprios erros a tempo de não serem definitivos...

Isto deveria constar no Preâmbulo da Constituição!!!
Patricia disse…
Lou, ontem li bem por cima o texto. Agora prestei atençao em cada palavra. O que está escrito aquii é ouro, é o que faz de ti iluminada.
Anônimo disse…
Tu hein?!!! ...tô te devendo uma "garele" ... tá lembrada do tombo na infância ... minutos depois q vc ganhou resolveu dar uma de boazinha e foi na minha carona ...hahahah ...caímos!!! Putz estraguei tua mobilete zerinho em folha! ..... ATT (pergunta para Carolis e para Gabi o significado da sigla). Bjos no teu coração! ;)))))

Postagens mais visitadas deste blog

observador mirim

Meu filho exerce um fascínio sobre mim. Não me canso de estudar a anatomia dele, escutar a voz com a fala enrolada, corrigir os verbos e incentivar a não falar de si em terceira pessoa. Gosto das nossas brincadeiras e das nossas intimidades, do olhar cúmplice que temos. Mais que tudo, eu gosto de admirar a maneira como ele evolui. Ele testa os limites, arrisca, se impõem, teima, opina. Às vezes ele até me repreende. Eduardo tem uma personalidade doce e decidida. Com dois anos e oito meses já escolhe as próprias roupas, decide o que quer comer, o desenho preferido e o sabor do suco. Divide comigo uma centena de questionamentos. Nós somos muito bons juntos. Fico admirada com a visão que ele tem das coisas, as pequenas percepções e as grandes conclusões. Uma vez, antes do almoço, minha mãe cortava batatas pra fazer a salada e suspirou. Imediatamente ele perguntou se ela estava muito cansada. A naturalidade da pergunta traduzia a simplicidade da constatação, a preocupação com o esta

biscoitices

Dessas tantas ruas por onde passo, de todos os caminhos que não decoro, por tudo onde já me perdi, afirmo com certeza que nenhum rumo é plano ou reto. Há sempre uma curva, um degrau, uma pedra, um muro, uma árvore. Eu sou uma desinventora. E o que eu desinvento a mim pertence. O que não pertence, eu furto, ou roubo armada de flores, risada e cara de doida. O que é viver se não é praticar a insana alegria de mais um dia. Rotina não cansa. Desmonto as horas em minutos e na hora de montar novamente sempre sobra um tempo que vira saudade, que vira bobagem, que vira suspiro, que vira só tempo perdido mesmo. O que me aborrece é pensar que quase preciso pedir desculpa pela minha felicidade, como se a tristeza fosse servida junto com as refeições. Não tenho lentes cor de rosa para o mundo, nem sei brincar de contente, mas com tudo que já vem fora de encaixe, não preciso procurar o que mais pode ser alvo do meu descontentamento. Todos temos cicatrizes. Só procuro levar tudo de forma que e

bacio

Casar anda muito moderno. Mais moderno do que casar é manter-se casado. Em tempos onde o divórcio é presenteado com facilidades, conservar o estado civil contratado pelo casamento é um desafio moderníssimo. Os casais insistem em casar. Insistem mais do que em permanecerem casados. Às vezes o matrimônio exige insistência – a maioria das coisas que se faz em dupla exige, mas não sei porque em matéria de casamento a palavra insistência vem acompanhada de revirar de olhos e bufadas. A insistência não é ruim. Os maiores e os menores feitos da humanidade são paridos da insistência, até aquelas descobertas acidentais. Adoro casamentos, tenho cerimônias de núpcias em todos os finais de semana de outubro. Haja vestido! Acho linda aquela hora que os noivos trocam olhares de cumplicidade. Gosto mais ainda quando cochicham qualquer coisa deixando o público curioso. O noivo fala baixo no ouvido da noiva. A noiva ri. Todos ficam curiosos. Ah... juras de amor! Ou pequenas piadinhas entr