Pular para o conteúdo principal

eu sou grande

Andar descalça na grama, sentar na calçada para contar as estrelas, cheirar a caixa nova de lápis de cor, essas são lembranças da minha infância que ainda pratico. Não posso dizer que as resgato porque nunca deixei de fazer. Fazia naquela época que o meu pai cortava a minha franja torta antes do banho. E precisava aquecer no bafo a tesourinha de cortar as unhas. Hoje dou conta da minha própria franja e de todas as minhas unhas. Crescemos nos detalhes.

Mais do que aprender a dirigir, trabalhar, cuidar da casa, do dinheiro, do filho e da família, crescer é não abandonar a infância. Não se faz um muro entre as idades. Eu ainda brinco de adivinhar a cor do próximo carro nas viagens chatas. Ainda sento no chão e como com as mãos, faço farelo. Ainda imito peixe nos espelhos e vitrines das ruas, corro dentro de casa para buscar as coisas e caminho de costas para testar se esbarro em algum móvel. Sempre esbarro. A diferença é que antes as quinas miravam a minha cabeça, hoje as vítimas são as pernas.

Não pretendo deixar minha infância guardada num álbum de fotografias ou sentada em alguma prateleira. Ela vem comigo. Que isso não se confunda com infantilidade – mesmo com as situações que me permito. Apenas acredito que é possível não abandonar a criança. Não quero me deixar no orfanato do tempo, gosto de me ter vendo graça em brincadeira boba, comendo sorvete até explodir. Não sei ver bola sem chutar! Não sei ter pudor para abusar da inocência. Outro dia me peguei tentando usar os sapatos da minha mãe.

Trazer essa simplicidade infantil para a vida adulta me deixa mais tranquila. Nunca me desfiz da imaginação de criança, do gosto por arriscar, não abandonei minha teimosia, nem a mania de dar pulinhos e agitar as mãos quando fico extremamente feliz, ou olhar muito séria para alguma coisa que eu desejo que suma. Isso também vale quando quero que alguém suma. Nunca deu certo. Vou continuar tentando. Ok, me chamem de ridícula.

Talvez a gente não precise levar tão a sério o que tem pouca importância, talvez construir um castelo na areia seja mais interessante do que ler o jornal na beira da praia. Exércitos que nunca existiram tentando cruzar os muros que a água do mar vai levar depois. Troco fácil uma noite de festa por uma noite campeonato de vídeo game.

Ter crescido sem abandonar a infância tem muitas vantagens. A melhor delas é não ter hora pra dormir.

A brincadeira invade a noite, mas nem todo mundo percebe.

----
 
 
 
 
ESTE TEXTO ERA PRA TER SIDO PUBLICADO NA SEMANA PASSADA. ANDEI VIVENTO DEMAIS E ME PASSEI... POR ISSO, PRA NÃO ENROLAR MAIS AINDA, VAI ASSIM, SEM MUSIQUINHA!
 
 
 
Às vezes nós temos a mesma idade.

Comentários

Carlos disse…
Essa "Criancice" madura é que te faz assim tão Kuky...

Postagens mais visitadas deste blog

poucos gigas

Eu não sou boa fisionomista. Não sou boa em lembrar dos rostos das pessoa que conheci. Se eu preciso encontrar alguém, tento lembrar da roupa que estava usando e se for “o Fulano, que estava bebendo água com a gente em tal lugar”, vou lembrar da marca da água, se era com ou sem bolinhas, como o Fulano bebia, onde era o lugar e o que fizemos, mas provavelmente, não me lembrarei do rosto da pessoa. Às vezes eu não presto muita atenção no rosto, escuto o que a pessoa fala, fico atenta aos gestos... pelo menos em uma primeira conversa. Sou detalhista demais pra prestar atenção apenas no rosto. A menos que a pessoa seja muito marcante já à primeira vista. Tive uma paixão adolescente no colégio. Por todo o segundo grau, na verdade. Era um menino que nunca estudou comigo, nunca namoramos, mas éramos declaradamente apaixonados um pela companhia do outro, pela nossa sinceridade e pela maneira como jamais nos cobramos nada. Havia um pacto branco de jamais mentir. Havia um pacto branco de não ...

(des)graças virtuais

Lembram que há posts atrás comentei sobre um fato engraçado que havia acontecido, mas eu não podia ainda contar porque não sabia como? Pois bem... contarei. Antes, é sempre bom lembrar que não é nada pessoal, tudo em nome da literatura. Faz de conta que aconteceu com a prima de uma amiga da sobrinha da vizinha da minha irmã. Ah, eu gosto de inventar personagens para fatos reais e me agradam fatos fictícios para personagens reais, também me autorizo complementar a verdade, inventar outras e ajeitar do jeito que eu bem entendo. Já que sou eu quem escreve, eu posso tudo. Não sou democrática quando escrevo. Nem quando tenho fome. Era uma vez, uma festinha. Dessas festinhas que acontecem todas as semanas, no mesmo lugar, com as mesmas pessoas reunidas, que a gente já tem até uma noção do que vai tocar, do que vai acontecer, de quem vai encontrar. Essas festas onde não precisamos de dons mediúnicos pra prever incomodação ou com quem se vai embora, melhor, com quem não se vai em...

o zodíaco, por mim mesma

Eu nunca acreditei muito nessas histórias de signo, até 2003. Horóscopo e previsões até hoje não leio, não levo a sério, uso pra fazer brincadeiras sobre o meu dia. PORÉÉÉM, em 2003, caiu nas minhas delicadas mãos cheias de dedos, e em frente aos meus olhos cheios de curiosidade, uma descrição da personalidade da pessoa de aquário. Era eu. E mais, uma descrição de uma pessoa de capricórnio. Era a minha irmã. Corri pra descrição do signo de touro – pessoa que mais tarde seria meu namorado – foi batata! Comecei a acreditar um pouquinho. Li todas as descrições de todos os signos e ficava tentando decifrar nas pessoas algumas das características e não é que MUITAS coisas batiam? Mais tarde me apresentaram um livro chamado NASCIDO NUMA DROGA DE DIA. É perfeito. Desde então acredito sim que os signos têm influência na personalidade das pessoas. Não que sejam todas iguais, mas que alguma coisa tem... Tem. Tem sim. E isso tem muito a ver com a maneira como as pessoas se relacionam com...