AUSÊNCIA
Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta. Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada,
aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência assimilada, ninguém a rouba mais de mim.
Carlos Drummond de Andrade
Saudade é o tipo de coisa que não se tem como fugir. A gente tranca a porta, ela pula a janela. A gente fecha a janela, ela atravessa a parede ou entra pela chaminé. Presença ilustre de festa que não foi convidada. Saudade é sentimento que acontece. É o que enche a taça do vinho que acabou.
Saudade é difícil de definir, complicada de explicar. É o tipo de coisa que cada um sente do seu jeito, não se pode condenar. Discordo quando leio que a saudade está relacionada com melancolia, nostalgia e solidão, apesar de haver uma explicação para isso. A palavra é derivada do latim, solidate, soledade, solidão, junto com derivados da saúde. Por isso é difícil traduzir saudade sem relacionar com falta, ausência ou solidão.
A saudade pode ser produto de uma tristeza. Pode ser o fim de uma fantasia. Mas não é necessariamente melancólica ou nostálgica. A nostalgia é uma lembrança do que se viveu, um sentimento bom que faz reviver o que passou. Os cheiros nostálgicos da minha infância quase me fazem esquecer como se fala. E pra mim, melancolia é algo tão triste, mas tão triste, que preciso escolher a dedo o dia pra sentir. Preciso ter certeza de dedicar um dia inteirinho para reviver as mágoas. É permitido o choro de soluços, a maratona de lágrimas desgovernadas. Se na saudade a tristeza é optativa, na melancolia é obrigatória. É requisito!
Minha saudade não é falta, é presença. É ocupar o pensamento com o outro. Relembrar os diálogos, fechar o olho pra sentir o cheiro, passar a pele no vento para imitar o atrito da respiração. Minha saudade vai atrás do que pode me deixar mais próxima, procura ler a distância, ver paisagens que atiçam a imaginação. Faz-me esticar os dedos no nada para desenhar um riso. E rir junto. A saudade não me deixa sozinha, me faz próxima.
Se a distância é física, a saudade é a proximidade da alma. Faz banquete para o desejo. Conta os dias na folhinha.
A minha saudade é excesso. Daqueles intensos que pratico com religiosidade. É criar intimidade com as lembranças, valorizar os minutos que os ponteiros do relógio não marcaram, é multiplicá-los por mil. A saudade é o que deixa mais gostoso dividir a mesma taça por pura economia de louça. É o que torna familiar o esboço de um olhar. É o prato servido antes da expectativa.
Não há angústia ou mágoa nessa saudade. Não quero matar a minha saudade, quero ter sempre que houver distância. Quero ser capaz de sentir. Depois quero guardá-la para mais tarde. Requentar, acrescentar novas lembranças, dar outro gosto. Minha saudade é feliz porque não me traz solidão. Ela paralisa os momentos para que eu possa assistir novamente todas as cenas, como se meu filme favorito fosse. Minha saudade é querer por perto os pedaços de mim que espalhei sem querer por aí. Remonta os sentidos que eu não faço. Sou permissiva com ela, em troca, ela não é perversa comigo.
Fiz amizade com a saudade. Assim ela não me dói, me consola.
Sábio Rubem Alves quando disse que “a saudade não deseja ir para a frente. Ela deseja voltar.”
É o meu desejo: que volte.
Fonte da Saudade - Kleiton e Kledir
Esse quarto é bem pequeno
Prá te suportar
Muito amor, muito veneno
Prá pouco lugar
O teu corpo é uma serpente
A me provocar
E teu beijo, a aguardente
A me embriagar...
Essa boca muito louca
Pode me matar
Se isso é coisa do demônio
Eu quero pecar
Fecha a luz, apaga a porta
Vem me carinhar
Diz aí prá minha tia
Que eu fui viajar...
Diz que fui
Prá Nova Iorque
Ou prá Bagdá
E que isso não é hora
De telefonar
Eu já sei que qualquer dia
Tudo vai dançar
Mas a fonte da saudade
Nem o tempo vai secar...
Essa boca muito louca
Pode me matar
Se isso é coisa do demônio
Eu quero pecar
Fecha a luz, apaga a porta
Vem me carinhar
Diz aí prá minha tia
Que eu fui viajar...
Diz que fui
Prá Nova Iorque
Ou prá Bagdá
E que isso não é hora
De telefonar
Eu já sei que qualquer dia
Tudo vai dançar
Mas a fonte da saudade
Nem o tempo vai secar...
Comentários
=)
Esta Solidão ta te fazendo TÃO Bem...
Beijinhos