Eu adoro o dia dos namorados. Verdade. Posso não gostar das vitrines com overdose de coração, das floriculturas com balões que atropelam as pessoas nas calçadas, das propagandas bestas com diálogos previsíveis, das promoções de motéis, de restaurantes, de ferragens, de petshops. Mas gosto de toda a função do dia doze de junho. Eu entro no clima, fico mais romântica, me pego procurando rimas de primário pra dar bom dia. Atendo o telefone com voz melosa, cada frase soa a miado de gato esperando a tigela de leite. Acaricio os móveis da casa como quem faz cafuné no cabelo do namorado – e isso quando estou verificando se há pó na mobília. Canto Djavan tomando banho.
Hoje pela manhã a manteiga do pão carimbou a beirada do prato com uma mancha que parecia um coração. Mostrei para a diarista:
- Olha!
- Arram, manteiga. Passou demais, vazou do pão.
- Não, olha bem, é um coração.
- Queres um guardanapo?
Eu juro pelos meus botões que era um coração de manteiga, uma declaração de amor do meu café da manhã. Uma singela demonstração de afeto gravada na louça fria. Comi meu pão com manteiga e tomei meu café preto sorrindo pelo agrado matinal. Foi tão galanteador quanto receber flores.
O dia dos namorados não depende de ter um namorado. É puro estado de espírito. Por isso não entendo as rivalidades entre solteiros e não solteiros. Não sou apreciadora das brincadeirinhas, das comparações, das infinitas enumerações de vantagens e desvantagens. Os prós e os contras não são combatentes. Para ter namorado, aconselha-se sentimento, porque namorar um chato apenas para ter alguém deve ser muito triste. Ao passo que não ter quem se ama deve igualmente fazer um solteiro ser infeliz.
Por isso optei por me embriagar do sentimento do dia dos namorados. Assovio para os pássaros, suspiro pelos cantos e vejo flores em você. Vejo flores em todo mundo. Em qualquer coisa. Passo vinte e quatro horas caída de amor! Faço toda a preparação nos dias anteriores, decoro Neruda, transformo Vinícius de Moraes em rei, compro roupa nova, escolho perfume. Distribuo sorrisos como quem dá as cartas em jogo de pôquer.
Já disse que o amor é jogo de cartas marcadas?
Dia dos namorados é assim, muito mais uma questão de estado de espírito do que de companhia. É paixão literal generalizada. É se dar ao trabalho de preparar o figurino para que o dia abra as cortinas de acordo com seu nome de batismo. É recitar Shakespeare para as nuvens: “Duvida da luz dos astros. De que o sol tenha calor. Duvida até da verdade. Mas confia em meu amor.” É brindar de taça cheia, com alguém ou com a própria sombra. O amor não tem calendário. O amor acontece todos os dias. Independe de companhia.
Solteira ou não, namoro sempre com a felicidade. Por isso desejo, para os namorados e não namorados, muita felicidade e muito amor, lembrando as palavras de Clarice Lispector: “Mas há a vida que é para ser intensamente vivida, há o amor. Que tem que ser vivido até a última gota. Sem nenhum medo. Não mata.”
Feliz dia dos Namorados!
É, só eu sei
Quanto amor eu guardei
Sem saber que era só prá você
É, só tinha de ser com você
Havia de ser prá você
Senão era mais uma dor
Senão não seria o amor
Aquele que a gente não vê
O amor que chegou para dar
O que ninguém deu pra você
É, você que é feita de azul
Me deixa morar nesse azul
Me deixa encontrar minha paz
Você que é bonita demais
Se ao menos pudesse saber
Que eu sempre fui só de você
Você sempre foi só de mim
Que eu sempre fui só de você
Você sempre foi só de mim
Comentários
Belíssimo dia dos enamorados para ti ;*
Inspirador!